sexta-feira, 26 de junho de 2009

Ética no Jornalismo Esportivo?

Essa semana eu estava assistindo, junto com o meu cunhado, à partida entre Cruzeiro x Grêmio pelas semi-finais da C. S. Libertadores, quando ficamos assombrados com o modo como José Roberto Wright (comentarista de arbitragem da Globo) tratava verbalmente o colega de profissão que apitou a partida.

Ao comentar a postura do árbitro chileno Henrique Osses na condução do confronto, o comentarista não mediu a força dos adjetivos ao qualificá-lo, com veemência e sem nenhum pudor, de INCOMPETENTE, FRAQUÍSSIMO e DESQUALIFICADO para apitar uma jogo daquela envergadura. Essas palavras não foram direcionadas a mim, mas, como telespectador, me senti constrangido ao perceber que Wright não demonstrava nenhum respeito pelo colega de profissão. Não que eu ache que ele devesse evitar críticas ao trabalho executado pelo juiz em campo, longe disso, mas que ele não deveria perder de vista o bom senso na leitura do jogo.

José Roberto Wright não precisa provar a mais ninguém o conhecimento em arbitragem que adquiriu ao longo de uma carreira escrita com competência, o que o elevou à categoria de árbitro de Copa do Mundo (apesar de algumas partidas polêmicas no currículo). Mas ele certamente teve dificuldades no início da trajetória e não foram críticas como as feitas ao Osses que o fizeram despontar na profissão.

As últimas notícias extraídas do futebol brasileiro, como o imbróglio envolvendo clubes e técnicos; a ausência injustificada de jogadores aos treinos obrigatórios; comentários racistas dentro de campo, entre outros, levam à reflexão de se já não passou da hora de revermos os conceitos de ética nas relações pessoais e profissionais no universo do futebol e do esporte como um todo.

Penso que Ética é mais que uma questão de saber se relacionar com o próximo. É uma questão de princípios, de caráter. Quando isso fica impresso em nossa personalidade, a boa conduta nas relações com os iguais acontece naturalmente.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

A Maçã no Escuro: o renascer do homem segundo Clarice Lispector

Discorrer sobre a complexidade da natureza humana não é mesmo uma tarefa das mais fáceis. Somos indivíduos formados por um verdadeiro turbilhão de idéias, confluência de sensações e desejos, construção e desconstrução da nossa própria realidade. Abarcar essa confusão, que nos define e nos alimenta, na dureza fria e limitada das palavras, pode parecer leviano para alguns, impossível para muitos, mas um hábito simples e constante na produção literária da genial Clarice Lispector.

Em A Maçã no Escuro, romance da década de 60 e um dos melhores livros de sua autoria, Clarice traz à tona o misterioso destino de Martim, rapaz perseguido pela idéia confusa e indefinida de supostamente ter cometido um crime, o qual ele próprio se julga incapaz de compreender. Determinado a livrar-se da confusão interior na qual se vê encurralado e sem o controle de si mesmo, o homem decide fugir para um lugar o mais distante possível, apagar todos os vestígios do passado e refazer sua própria natureza humana.

O enredo, quase todo desenvolvido no cenário bucólico de uma fazenda no meio do nada - onde Martim passa a se relacionar com personagens-chave na sua tentativa de auto-reconstrução – guarda muita semelhança com a gênese da criação humana descrita pela Bíblia. A atitude de Martim, nessa comparação, se identifica com a postura do Criador, por se considerar capaz de reconstruir a si mesmo e, nessa sensação de onipotência, se perceber possuidor de todas as coisas que existem.

O romance, de linguagem densa e rebuscada, convida o leitor para uma reflexão profunda sobre as diversas “máscaras” que vestimos no dia-a-dia e os papéis que “interpretamos” nas relações cotidianas com o próximo. O desejo de Martim em se tornar outra pessoa, renegando a si mesmo, lança luz ao problema da perda de identidade do indivíduo em sociedade, que procura se adequar a padrões de comportamento pré-definidos pelo temor de ser tido como um “estranho”.

Poucos escritores conseguiram até hoje nos fazer perceber a nós mesmos numa obra literária com a habilidade e a maestria singulares de Clarice Lispector. Seus textos intrigantes, herméticos em muitas passagens, mas inexplicavelmente compreensíveis no mais íntimo de nossa essência, conseguem nos conduzir ao subconsciente, ao nascedouro dos desejos, das paixões, frustrações, alegrias, tristezas, medos.

Uma escritora no sentido mais completo da palavra, que transcendia os limites da lógica sem deixar de ser racional; que ultrapassava os limites da subjetividade sem cair no lugar-comum da filosofia barata.